A complexidade da questão indígena ( II )

Wilson Valentim Biasotto 

Em matéria disponibilizada no site www.biasotto.com.br  dissemos que não obstante a complexidade da questão indígena, como cidadão douradense, nos propúnhamos a contribuir com algumas sugestões. Aproveito para começar hoje, dia em que se encontra em Dourados uma Comissão inter-ministerial designada pelo presidente Lula, a pedido do prefeito Tetila em pleito que protocolizamos na Casa Civil em 30 de março do corrente ano.

Digo como cidadão porque entendo que os douradenses de forma generalizada devem se envolver nessa questão. Não simplesmente para dar um cobertor em época de frio, mas abraçar a reserva indígena porque apesar dela ser território federal, os índios que nela residem devem ser tidos e havidos como cidadãos que ajudaram a construir a identidade de nosso Município. Isto quer dizer que deve haver um processo de alteridade, um respeito “ao outro”, uma interação igual a que existe entre os não índios de variadas raças que convivem e também constroem a história e os destinos de Dourados.

Não adianta buscarmos soluções sem que antes tenhamos assimilado que os índios, embora de cultura diferente, nos enriquecem, não nos empobrecem. Ou nós outros, não índios, entendemos que não temos nada a aprender com eles? Mesmo que pensássemos assim, o que seria errôneo, deveríamos refletir se somos civilizados suficientemente para convivermos com a pluralidade racial e a diversidade cultural.

Essa é, portanto, a primeira questão que precisa ser resolvida. A prefeitura de Dourados, através de sua Secretaria de Educação deveria promover uma ampla campanha, conscientizando a sociedade douradense de que os índios de Dourados ao mesmo tempo em que devem manter a sua cultura e as suas crenças, precisam avançar no processo civilizatório, mesmo porque, por estas bandas não haverá mais caça e pesca abundantemente suficientes e a agricultura de subsistência não satisfaz mais a todos os indígenas, principalmente aos jovens.

Para evitar mal entendidos voltemos por um tempo à questão do cobertor acima posta. Se os índios estiverem com frio devemos sim providenciar o cobertor, se tiverem sede providenciar a água. Seria relativamente fácil resolvermos esse tipo de questão emergencial. Bastaria uma grande campanha envolvendo prefeitura, câmara, sociedade organizada, universidades, escolas de ensino médio e fundamental. Portanto, não estamos nos posicionando contrários a esse tipo de ação que muitos entenderiam como assistencialista, pelo contrário, penso que deveríamos, como disse, abraçar a nossa reserva, os nossos irmãos índios e respondermos positivamente às suas necessidades básicas.

Quando exercemos o cargo de vereador tínhamos convicção de que necessitávamos de uma ação firme para reflorestarmos as duas reservas de Dourados (Francisco Horta e do Panambizinho), no entanto quando vimos que os índios estavam acendendo o fogo com talos de pés de quiabo não tivemos dúvidas em atender à proposta do prof. Jorge Eremites e encaminharnos ao prefeito Tetila uma indicação para que a prefeitura fizesse chegar a lenha da poda de árvores da cidade até a reserva. Resolveu o problema? Claro que não, mas minimizou, centenas de caminhões com lenha foram enviados nos últimos anos.

Da mesma forma que atuamos em relação à lenha, o Rotary douradense atuou doando cerca de 100 fogões e outras entidades fizeram ações semelhantes. O que tem faltado é ação conjunta, coordenada. Se nos organizássemos poderíamos resolver emergencialmente o problema da água, por exemplo. O UNICEF está pronto para oferecer um filtro para cada casa dos 18 municípios do sul de Mato Grosso do Sul, basta a água.

Avancemos agora para uma outra questão. A complexidade da causa indígena em Dourados passa pela questão da terra, porque na verdade não temos uma reserva indígena mas uma área de confinamento indígena. Contraditoriamente não basta aumentar a área, como foi feito no Panambizinho, porque se não houver lenha, por exemplo, os índios são capazes de colocar no fogo caibros vigotas e ripas, que para os não índios teriam outras serventias.

Muitos não índios não se conformam com esse tipo de procedimento, no entanto o fogo é algo necessário, é sagrado para eles. Fogo de lenha, lenha que vem da árvore, que deve ser plantada, cultivada, aproveitada racionalmente. Para tanto é preciso terra. Por essa e mais uma centena de razões é necessário ampliar a reserva. Mas até quando ou até quanto? E além do mais somente a terra não resolve, é preciso também técnica, técnica que os índios não têm porque nunca precisaram plantar árvores. Não basta dar a muda, os índios não combateriam as formigas, porque nunca precisaram combater formigas.

Percebe o leitor porque os índios não executam certos trabalhos?

O espaço é exíguo. Voltaremos a escrever sobre algumas outras sugestões. Ficam de antemão registradas algumas idéias. 1) As ações dentro das reservas indígenas não podem continuar pulverizadas como estão, é preciso uma comissão permanente, com um coordenador geral para tocar as ações; 2) O governo federal deve instituir um percentual per capita indígena para repassar aos municípios que tenham reservas indígenas, através do Fundo de Participação dos Municípios, 3) A escola deverá ser o centro de todas as atividades nas reservas e as crianças deverão permanecer nelas em tempo integral; 4) As atividades na escola devem atingir jovens e adultos; 5) A escola não deverá ter apenas o papel educativo teórico, mas exercer um acompanhamento das práticas ensinadas: 6) A escola formal nas reservas, sendo o centro das atividades da comunidade indígena, deverá ser diferenciada a ponto de oferecer atenção a todos os ramos das atividades indígenas, inclusive a cultura, o lazer e o esporte, tão ausentes e necessários nas reservas; 7) Todo não índio que trabalhar nas escolas das reservas deverão estar conscientes de que não estão lá para assimilar o índio à sua maneira de pensar e agir, mas contribuir no avanço do estágio civilizatório em que se encontram.

          Diante da complexidade da questão não pretendemos resolver tudo com uma simples série de artigos, nossa intenção é contribuir de modo a nos afastar das mesmices que têm sido propostas ao longo dos últimos anos. Voltaremos ao assunto.

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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