Obras ou obrismo?

 

Wilson Valentim Biasotto *

 

Recente polêmica travada neste espaço sobre o obrismo levou-me a refletir sobre o assunto. Primeira coisa que me veio à mente foi Brecht e o seu maravilhoso poema: “perguntas de um trabalhador que lê”. Permita-me o leitor a transcrição do texto: “Quem construiu a Tebas de sete portas?/Nos livros estão os nomes do reis/Arrastaram eles os blocos de pedra?/ E a Babilônia várias vezes destruída – Quem a reconstruiu tantas vezes?/Em que casas da Lima dourada moravam os construtores?/Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muraralha da China ficou pronta?/ A grande Roma está cheia de arcos do triunfo./Quem os ergueu?/Sobre quem triunfararam os Césares?/A decantada Bizâncio tinha somente palácios para seus habitantes?/Mesmo na lendária Atlântida os que se afogavam gritaram por seus escravos/ Na noite em que o mar a tragou. // O jovem Alexandre conquistou a Índia./Zozinho?/César bateu os gauleses./Não levava sequer um cozinheiro?/Filipe da Espanha chorou, quando sua Armada Naufragou.? Ninguém mais chorou?/Filipe II venceu a Guerra dos Sete Anos./Quem venceu além dele? // Cada página uma vitória. Quem cozinha o banquete?/A cada dez anos um grande homem./Quem pagava a conta? // Tantas histórias./Tantas questões.”

Para o leitor que acompanhou o debate sobre o obrismo talvez eu não precisasse dizer mais nada, entretanto, como presumo que nem todos tiveram a oportunidade de ler os três artigos publicados sobre o assunto, tenho o dever de ir adiante.

No debate, Tetila condena o obrismo, Cesar Lutti discorda e aponta, dentre outros exemplos, as pirâmides do Egito e os jardins da Babilônia como paradigmas a serem seguidos pelos governantes. Valfrido Silva, sempre muito argucioso, não deixa, num primeiro momento, de salientar a contradição de dois representantes de partidos aliados (PT e PSB), apresentarem propostas tão distintas e, na seqüência, arremata, não sem uma boa dose de ironia, que o PT está mudando para melhor, na medida em que está sim, preocupado em edificar obras.

Veja o leitor, edificar obras é uma coisa, o obrismo é outra. A edificação de obras pressupõe benefícios sociais. O obrismo limita-se à construção de obras que, embora possam ser gigantescas, não apresentam nenhuma ou muito pouca função social e, via de regra, o obrismo, serve aos interesses de governos e empreiteiros inescrupulosos que dilapidam o dinheiro público.

Coloquemo-nos no lugar dos egípcios. Será que optaríamos em construir aquelas enormes pirâmides, ou construiríamos milhares de casas para abrigarmo-nos das intempéries? Se estivéssemos em Roma, optaríamos pelos arcos de triunfo ou pela construção de aquedutos que nos levasse água potável a nossas residências?

Tomemos outro viés. O que é mais útil para a humanidade e se universalizou: as pirâmides ou o sistema de irrigação de lavouras que os egípcios usavam? Os arcos de triunfo romano ou o seu  Código de Leis e a sua organização administrativa? Se nos fosse dado escolher entre o obrismo antigo e a filosofia grega qual tomaríamos para nós? Se fossemos obrigados a decidir entre o Jardim Suspenso da Babilônia e todos os arcos de triunfo juntos e, por outro lado, com o Cristianismo, com o que ficaríamos? Enfim, entre os maravilhosos castelos e a Universidade, que é uma instituição medieval, qual seria a nossa opção?

É um belo debate, que começa, aliás, a demarcar os rumos da campanha eleitoral do ano 2000. Muito bom se o tom for mantido nesse nível. Ganha Dourados.

*O autor é doutor em História Social

pela USP e diretor do Câmpus de Dourados da UFMS                                                                                                       

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br