Aprendizado doloroso

 

Wilson  Valentim Biasotto *

1.04.98

 

Há dois meses não publico minhas crônicas neste jornal. Alguns leitores, amigos bondosos, que sempre me estimulam com uma palavra carinhosa sobre os meus escritos, quiseram saber a razão. Penso que os leitores mais distantes do meu convívio também gostariam de ouvir minha história.

Não foi por falta de tempo. É verdade que as vinte e quatro horas do dia têm sido poucas, mas não insuficientes. Já aprendi, não sem dor, através de meu irmão, quando vim para Dourados há vinte e quatro anos, e me demorava para escrever-lhe, que tempo é uma questão de preferência.

 A história é outra. Tive problemas com meu computador. Na verdade nunca nos demos muito bem. Meu primeiro amor com um três oito meia  não foi feliz. Julguei-me um ser inferior, pouco inteligente diante da máquina onipotente e o meu sofrimento com a aprendizagem era maior que os benefícios. Depois veio a dúvida mais cruel, logo comprovada, de infidelidade. Não pude mais confiar-lhe os meus escritos já que fizera desaparecer, misteriosamente, mais de trinta páginas de um trabalho científico que lhe confiara.

Disseram-me que o quatro oito meia era melhor; mais prestativo graças a rapidez com que me serviria; mais moderno, mais isso e aquilo e, sobretudo, mais digno de confiança.

Confiei e, de fato, durante alguns anos ele serviu-me bem. Em sua cabeça, ou entranhas, sei lá, fui depositando as minhas crônicas, meus artigos, minhas palestras, enfim, fui confiando-lhe a minha produção, da mesma forma que o capitalista vai confiando os seus rendimentos ao banco.

De repente, não mais que de repente, como diria o poeta, o meu novo amor traiu-me da maneira mais ignóbil. Esvaziou-se simplesmente e eu quase me pus a chorar por ter perdido tanto. Senti principalmente pela perda de uma obra, praticamente pronta, sobre os casos de Liberato Leite de Farias, o Laquicho. Eram cerca de duzentas páginas, que terei que reescrever para resgatar os sessenta e quatro casos compilados e devidamente trabalhados.

Não me dou por vencido! Um técnico formatou novamente o meu quatro oito meia e eu, pacientemente, o tolerarei até o dia em que o governo federal entender que os servidores públicos merecem um bom reajuste salarial. Aí, será a glória, a traição será minha, irei buscar imediatamente um novo amor num pentium, ou algo novo que o valha.

Enquanto isso vou aprendendo de forma dolorosa, mas não me lastimo, compreendo o fenômeno, foi assim também com o carro, que aprendi a dominar aos trancos e barrancos, literalmente.

Ah! Essas maravilhosas máquinas! Tão frágeis que não resistiriam a um só golpe de machado!

Ah! pobre geração essa minha, que tanto sofre para aprender a lidar com as máquinas sem sucumbir diante das vertiginosas transformações deste fim de século.

 

O autor e doutor em  História Social

 pela USP e diretor do CEUD/UFMS

 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

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2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

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MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

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Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

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[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

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Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

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