Cara Silvana

 

Cara Silvana,

                             

                                     Wilson Valentim Biasotto *

 

Claro que seu nome é fictício, mas escrevo-lhe para dizer que agora que toda a minha papelada, que dependia de seu despacho, está encaminhada, envio-lhe esse mimo como reconhecimento de minha gratidão por ter sido tão gentilmente atendido todas as vezes que estive consigo tratando de assuntos de meu interesse. Não o ofereci antes para não ser mal interpretado. Muitos poderiam pensar que estivesse tentando agradá-la para ser beneficiado. 

Você poderia me dizer que não fez mais que a sua obrigação. Que ser gentil é dever de todo servidor público, aliás de todo ser humano, que lhaneza no trata é coisa de pessoas civilizadas, e daí por diante. E eu concordaria plenamente consigo se, de fato, me dissesse isso. Mas permita-me contar-lhe uma história da qual fui protagonista para que você compreenda melhor o meu gesto.

No início dos anos 70 quando comecei a minha carreira como funcionário público no então chamado INPS (Instituto Nacional de Previdência Social) fui posto para trabalhar como atendente de serviços médicos. As filas eram enormes, o   atendimento precário e embora não chegasse ao estado caótico em que se encontra hoje, as pessoas demoravam muito para serem atendidas..

Numa tarde, em que o ambiente estava meio tumultuado pelo excessivo número de pacientes, eu  atendia a uns e outros, com a mesma dedicação de sempre, agindo com a máxima presteza e com muita paciência, especialmente por saber que aquelas pessoas, de uma forma ou outra, não se sentiam bem, afinal, se estavam procurando um médico era porque estavam doentes. Nesse dia, após ter sido consultado e saído, um homem voltou ao meu posto e deu-me um pequeno embrulho. Disse-me que ficara admirado de ver-me trabalhando daquela maneira e que eu recebesse aquele vinho como prova de seu reconhecimento.

Do vinho não lembro a marca nem o sabor. Do homem não sei o nome nem lembro o rosto. Nem sei por onde anda, se é que anda ainda. Sei que era francês de nascença.

 Seu gesto sensibilizou-me, deixou-me feliz. E eu fiquei a imaginar que muitas outras pessoas, que passavam diariamente por aquele Posto do INSS, deveriam estar satisfeitas com o atendimento que lhes fazia sentirem-se gente. Claro que não me davam mimos, algumas sequer diziam obrigado. Mas que culpa tinham? Afinal nem todos  nascem na França.

Com certeza, aquele pequeno presente serviu-me de incentivo, não pelo seu valor intrínsico, mas pelo seu valor simbólico. Claro que não foi a única nem a mais importante razão para que eu fosse sempre um funcionário esforçado. Nem sempre gentil, nem sempre paciente e alegre é verdade, mas sempre com muita consciência e honestidade.

Agora, quando você toma as últimas providências para encaminhar a minha aposentadoria, gostaria de lembrar-me do nome daquele vinho que um dia ganhei de uma pessoa agradecida. Estou certo de que foi o melhor vinho que já tomei em toda a minha vida, embora, como lhe disse, não me lembre o seu sabor. Desejo que o licor, que ora lhe envio, tenha o mesmo sabor para você.

*O autor é doutor

em História pela USP e prof. do CEUD/UFMS

                                                             6-mar-96

 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br