A lágrima de Helena

Wilson Valentim Biasotto*

 

            Meu profundo respeito a todas as mulheres (e homens) que lutam, choram e   sofrem

acalentando um sonho e  não se vergam jamais quando se trata da defesa de princípios.

 

 

Vi muitas lágrimas em minha vida. Algumas ajudei a enxugar, outras acompanhei, outras ainda chorei sozinho. Lágrimas são gotas benditas, quase miraculosas. Aliviam a dor, acalentam a esperança e substituem até mesmo o riso, quando a alegria é incontida. A lágrima, além disso tudo, é a expressão mais forte dos sentimentos humanos.

Dizem alguns que lágrima é coisa de mulher, que homem não chora. Existem até músicas que contribuem para firmar essa crença. Martinho da Vila, por exemplo, já cantou que "o homem que é homem não chora... (mesmo) quando a mulher vai embora..."

Desde minha adolescência, no entanto, aprendi no poema "I-Juca Pirama", de Gonçalves Dias, que os homens, mesmo os mais fortes, choram. Lembro-me do verso recitado pelo velho Timbirá, pai de um prisioneiro, que ao cientificar-se de que seu filho não era um covarde, como julgavam erroneamente os Aymorés, chorou dizendo: "Corram livres as lágrimas que choro / Essas lágrimas sim que não desonram".

Nenhuma desonra também nas lágrimas presidenciais de Luís Inácio Lula da Silva, que emocionaram o Brasil, ao ser diplomado . Tão forte foi a emoção do velho sindicalista, tão puro o seu sentimento que, emocionados também, muitos homens e mulheres desse imenso Brasil acompanharam-no.

Nunca tinha visto algo semelhante na história do Brasil. Penso que o choro do presidente significa algo mais que a forte emoção que mencionei, suas lágrimas significam que um homem humilde chegou ao poder e tem a exata compreensão da dimensão da missão que o  aguarda. O povo brasileiro deve ter compreendido bem isso.

Ao vivo vi outra lágrima que não desonra.

Estava em reunião com o falecido Odilon Martins Romeu, o todo poderoso Secretário de Recursos Humanos do governo Harry Amorim Costa,  em 1979, fechando o Plano de Cargos e Salários do Magistério Público Estadual, no momento em que ele soube da destituição do governo, seis meses após a implantação do Mato Grosso do Sul. Uma lágrima rápida rolou-lhe dos olhos. Não comentou absolutamente nada. Não fez uma única crítica. Agradeceu-me pela sinceridade com que desempenhei o meu trabalho, e disse que as minhas críticas contundentes  ajudaram-no a olhar para fora da janela do poder, pois lá dentro só existiam os áulicos, capazes apenas dos elogios fáceis.

Confesso que o  elogio me fez bem naquela época, todavia a lágrima do Secretário deu-me a dimensão exata  do seu sentimento. Sua lágrima, embora ligeira, foi para mim, um documento claramente compreensível: naquele momento Mato Grosso do Sul deixava de ser um estado modelo.

Vi muitas lágrimas, já disse. Nenhuma no entanto me tocou tanto quanto a lágrima saída dos olhos intensos da senadora Heloísa Helena.

Tive o privilégio de conhecê-la pessoalmente, de ouvi-la, de dialogar com ela. Heloísa Helena é firme, possui absoluta clareza ideológica, tem princípios bem definidos, mas, acima de tudo, é uma criatura meiga, cativante, doce.

A lágrima de Heloisa Helena, não foi uma lágrima comum, não representou um  desabafo, uma frustração, uma forte emoção. A lágrima de Heloísa Helena embora bela como uma gota de orvalho a escorrer pela folha verde numa manhã ensolarada, não foi uma poesia. A lágrima de Heloísa Helena foi um hino. Um hino que somente pôde ser compreendido por aqueles que acreditavam, como ela, em mudanças mais consistentes quando o PT chegasse ao poder. Um hino ouvido por todos aqueles que jamais trocaram os seus princípios pela conveniência do momento. Um hino de coerência para com a vida e de louvor aos que acreditam num mundo mais justo, mais fraterno, mais igual.

Emociono-me ainda hoje com o choro do velho Timbira, com o choro de Lula e com o de Odilon Martins, mas a lágrima de Heloísa Helena eu gostaria, se pudesse, tê-la chorado junto.

 

*O autor é doutor em História Social pela

USP,   professor aposentado   da   UFMS/Dourados

                          e   vereador  em Dourados    pelo  PT.

 

 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br