Lula, Marçal e os intelectuais

Wilson Valentim Biasotto*

março/2002

 

Que é um intelectual?

Difícil responder, justamente porque existem várias respostas. Dentre essas respostas existentes, eu, particularmente, adoto a definição dada por Antonio Gramsci, na sua obra "Os intelectuais e a organização da Cultura". Quando, portanto, atribuo a designação de intelectual a alguém não o faço arbitrariamente, amparo-me em uma obra clássica sobre o assunto.

Esquematicamente poderíamos afirmar que intelectual é todo aquele que trabalha com o intelecto.  Nesse sentido todos os humanos são intelectuais, pois, grosso modo, mesmo o trabalho físico mais humilde requer um certo grau de atividade intelectual

Todavia, como o próprio Gramsci explica, se alguém eventualmente frita um ou dois ovos, não quer dizer que seja cozinheiro; da mesma forma não se é intelectual apenas porque o intelecto funciona quando se exerce alguma atividade essencialmente motora. Nesse sentido o que se pode afirmar é que não basta a simples ação do intelecto para se ser intelectual, é necessário que a ação do intelecto seja predominante.

Aprofundemos um pouco mais a questão. No sentido até então exposto, pode-se afirmar que um professor seja um intelectual?

Tive um professor de história que ficou famoso por repetir todos os anos a sua aula: os mesmos pontos, as mesmas vírgulas, as mesmas piadinhas sem graça ao final de cada capítulo. Penso que esse tipo de professor somente exerceu o papel de intelectual quando preparou a sua aula, sabe-se lá quando. Depois, ao repetir sistematicamente todas as suas aulas, deixou de ser um intelectual para exercer um trabalho mecânico.

Da mesma forma poderia me referir aos médicos, jornalistas, políticos, e outras categorias. Se esses profissionais estiverem exercendo as suas respectivas práticas mecanicamente, de forma repetitiva, não gerando absolutamente nada novo, não tendo nenhum traço criativo, não posso considerá-los intelectuais.

E assim também é com o político. Se o seu trabalho se restringir ao clientelismo, à apresentação de requerimentos e indicações corirqueiras, enfim ao exercício de um mandato robotizado, não teremos aí um político intelectualizado.

Enfim, mesmo os professores, médicos, jornalistas, políticos, gente que trabalha mais com o intelecto do que com a força motora, somente poderão ser considerados intelectuais se as suas respectivas atividades forem criativas.

Disse, recentemente, em um programa de televisão, que Lula é um intelectual respeitado. Foi o que disse, e repito: Lula é um intelectual respeitado. Veja o leitor que não afirmei que Lula é o melhor intelectual, mas sim que é um intelectual.

O prezado leitor pode gostar ou não de Lula. Pode considerá-lo, ou não, um grande líder político, no entanto ninguém pode negar que Lula seja um intelectual. Isto porque exerce as suas atividades no mundo político com criatividade, haja vista, inclusive, a criação do Partido dos Trabalhadores, nascido das lutas históricas travadas contra a ditadura militar no ABC paulista.

A exemplo de Lula, aqui mesmo, em Dourados, bem pertinho de nós, tivemos um outro intelectual:  Marçal de Souza, ou Marçal Tupã ' i. E não fui eu quem afirmou isso. Foi Darcy Ribeiro, com essas palavras, no fatídico ano de 1983, quando Marçal foi assassinado: " Eu disse recentemente que em Marçal morre o principal intelectual de Mato Grosso. Eu sei que aqui está cheio de poetas, de artistas, de romancistas, de autores de livros. Mas como intelectual que sou, reconhecido mundialmente, sei quem são os meus irmãos. O intelectual não precisa escrever livro nenhum, o intelectual é o homem que é o espelho do seu povo, a voz dos oprimidos".

 

O autor é doutor em História Social pela

USP,   professor   da   UFMS/Dourados

                           e   vereador  em   Dourados    pelo  PT.

 

 

 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br