2010: o ano que não acabou para Dourados

 

Definitivamente, 2010 foi o ano que não acabou, ao menos para os douradenses. Um ano sem fim é um ano mal resolvido, um ano que termina apenas e simplesmente no calendário. De qualquer forma, apesar de insepulto, foi um ano marcante, que registrou uma história para não ser esquecida. É verdade que preferimos nos lembrar dos anos venturosos tanto em nossas vidas particulares quanto na de nosso município, estado e país, mas ao historiador não é dado viver somente de venturas, as desventuras devem ser também lembradas e estudadas para se tirar delas as lições que nos norteiem para um futuro melhor. 

Para o bem ou para o mal houve uma reviravolta grandiosa na política de Dourados e não creio no clichê de que “quanto mais as coisas mudam mais elas permanecem as mesmas.” Nada mais será o mesmo embora os personagens insistam em reprisar as mesmas cenas e os mesmos papéis. Senão, vejamos:

A fórmula mágica para se resolver os problemas de Dourados não foi em momento algum encontrada pelos douradenses. Veio de fora. Ou alguém acredita que as gravações condenatórias feitas pelo secretário Passaia foram por iniciativa própria?

Depois vieram as prisões e as renúncias. Alguém crê que o ex-prefeito Ari Artuzi, o ex-vice prefeito, Carlinhos Cantor e o ex-presidente da Câmara Sidnei Alves, tenham renunciado, no mesmo dia, na mesma hora, por transmissão de pensamento? Não seria melhor crer que houve um acordão, intermediado pelo advogado?

Nesse ínterim alguém duvida de que não tenham havido articulações no sentido de se resolver o problema da vacância dos cargos sem a necessidade de eleição? Não teriam havido tentativas de golpes? Haverá algum cidadão douradense que atribua apenas à condução da Justiça o rumo que tomou a sucessão? Não haveremos de atribuir importância ao movimento popular e estudantil que foi às ruas clamar por eleições?

Enfim, teremos eleições e um novo prefeito. Mas, escolhido pelo povo?

Não, nem pelo povo e sequer pelas forças vivas de Dourados. Mais uma vez a solução veio de fora, sendo que dois personagens destacaram-se nos encaminhamentos, o senador Delcídio do Amaral, sereno como os remansos dos rios pantaneiros e o governador André Puccinelli, turbulento como as ondas oceânicas que o trouxeram um dia da Itália para o Brasil. Ambos, cada qual à sua maneira, organizaram uma coalizão partidária jamais vista e sequer pensada, em torno da candidatura de Murilo Zauith que, paradoxalmente, pertence ao partido que é o maior opositor à coligação PT/PMDB no âmbito nacional.

Ora, ora, uma arquitetura política dessa envergadura – que fugiu inclusive à tendência natural de uma aliança PT/PMDB - somente pode ser entendida se André e Delcídio estiverem aliados desde já para a eleição governamental de 2014 e se Murilo também apoiar esse projeto e migrar para um outro partido, tão logo seja eleito, quiçá o PSB. Restaria saber para onde iriam Zé Teixeira, Waldir Guerra, Gino, Sidlei, Bambu e outros tantos filiados do DEM douradense. Mas, de qualquer forma, a virtual eleição de Murilo não coloca na prefeitura uma liderança de peso e sim um ungido pelas mãos de caciques políticos, mutatis mutandis, como aconteceu com Ari Artuzi.

Mas teria havido apenas a domesticação de Murilo? E as lideranças locais do PT e PMDB?

No PMDB, Délia Razuk, prefeita interina, ensaiou a sua candidatura, inviabilizada por falta de apoio do governador e do PT. O PT por estar dividido entre a candidatura própria e o apoio à Murilo. Quanto ao governador, já estava compromissado com Murilo, mas aproveitou mais uma das encenações do deputado Geraldo Resende -  que também postulou a sua candidatura  - e bateu na mesa, afastando o PMDB da disputa.

Quanto ao PT as esquisitices foram ainda maiores. Tetila e João Grandão penderam para o lado de Delcídio, Dirceu Longhi pendeu para o lado de Vander Loubet, todos apoiando Murilo e Elias Ishy ao defender candidatura própria pendeu para o lado de Zeca do PT. Agora não bastasse a divisão Delcídio e Biffi de um lado e Zeca e Vander de outro, este se posiciona contra o próprio tio. Definitivamente o PT, não é mais um partido com tendências diversas, é uma frente de partidos dentro de si próprio, que concorre numa luta fraticida e destrói os alicerces que havia fincado em Dourados e no Mato Grosso do Sul. E quem estiver imaginando que Elias Ishy é um heróico combatente engana-se redondamente. Se houvesse se inscrito algum candidato de uma outra tendência dentro do partido ele e a Articulação de Esquerda – a sua tendência partidária - se colocariam à margem do processo, a exemplo do que fizeram com a minha candidatura para deputado estadual em 2002 e em outras oportunidades, tanto comigo quanto com outros candidatos.

Com certeza o PT perderá militantes históricos que não conseguem sequer entender essa engenharia política, quanto mais aceitá-la. Para onde irão não sabemos, mas mais uma vez abriu-se em Dourados a perspectiva da retomada do poder pela direita, sabe-se lá por mais quantos anos. Ninguém, do PT com certeza, assumirá a autoria desse atentado, mesmo porque todos nós do partido acabamos tendo um pouco de culpa.

Com muito sofrimento curvo-me a essa coligação, por entender que a atitude da Articulação de Esquerda, ao lançar a candidatura de Elias Ishy foi oportunista e interesseira tanto quanto a própria coligação. A vantagem da coligação é que ela traz em seu bojo a figura de uma guerreira que foi alicerce na implantação do Hospital Universitário, Dinaci Ranzi, como vice. Nela uma pequena chama de esperança.

Mais uma vez volto a insistir em algo que tenho dito com frequência, enquanto Dourados não encontrar em si própria as forças para a condução de seu destino, estará condenada a ser estrela de pequena grandeza. Significa dizer, enquanto as nossas forças vivas – entidades representativas – e a nossa imprensa não tiverem uma posição diferente haveremos de purgar esses processos impúrios.

As forças vivas, ao contrário de se imporem como legítimas porta-vozes dos principais projetos do município e exigirem dos políticos, macumunam-se na maioria das vezes e esperam dos políticos aquilo que deveriam fazer. E a imprensa, da mesma forma, por necessitar do patrocínio financeiro dos políticos e/ou instituições públicas, acabam silenciando fatos, amenizando críticas e quando não enaltecendo políticos de estatura anã.

Enfim, em 6 de fevereiro vamos à eleição.

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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