Crônicas em retalhos: o parto da montanha

 

As fábulas: dentre as fábulas de Esopo, a do parto da montanha é bem oportuna para esse momento da história de Dourados. Uma montanha começou a fazer um barulho muito grande. Roncava, rugia, sei lá. A verdade é que pessoas de todas as partes do mundo se aproximavam da referida montanha para ver o que estava se passando. As pessoas achavam que a montanha estava em trabalho de parto, que ia ter um filho. E os dias, as semanas e os meses foram passando, até que depois de um barulho ensurdecedor, a montanha se rachou e do meio da poeira e do barulho surgiu... um camundongo.

Doido ou sábio?: Vejam que coisa mais doida. Estou achando que o controle remoto foi inventado há milhares de anos, mas o seu idealizador, achando o seu invento muito adiantado para aquela época desistiu de apresentá-lo ao público. Criou então a história de Ali Babá e os Quarenta Ladrões. Nessa história Ali Babá chegava perto da montanha e dizia: ”Abra-te Sésamo! Não dá para relacionar? Ou seja, o parto da montanha não poderia ser também uma fábula escrita por alguém que tivesse receio de apresentar claramente as suas ideias?

Idéias: Às vezes transformamos ideias em projetos e somos ridicularizados por isso. Eu mesmo já passei várias vezes por esse tipo de situação, a exemplo de quando no final dos anos de 1970 defendi a UFGD, ou quando defendi a Cidade Universitária, o Trem Universitário, a Cidade Educadora. Enfim, estou chegando à conclusão de que os demasiadamente sábios criam fábulas e os homens comuns, que enxergam apenas o seu próprio tempo, como eu, expõe idéias.

Do debate vem a luz: No meu caso em particular costumo dar idéias para contribuir com o debate, pois creio que é do debate, da discussão de idéias que vem a luz, surgem as saídas. Do debate de idéias, mesmo das irônicas e provocativas, é que são tiradas as melhores decisões.

Nosso parto: O Mato Grosso do Sul, e Dourados de forma particular, está passando pelo verdadeiro parto da montanha. Às vezes o ronco, ou rugido, sabe-se lá, não é tão intenso pelas próprias circunstâncias. Nós, o povo, temos os nossos afazeres, por isso acomodamo-nos com a democracia representativa. Os juízes têm centenas de processos, não podem dedicar-se a um único. A imprensa tem milhares de notícias, não pode martelar em uma só tecla. Mas, enfim, passam os dias, as semanas, e o barulho pode aumentar ou diminuir, mas o parto será concluído.

Enfim a questão: Dourados após a Operação Uragano ocorrida em setembro passado passa por um constrangimento atrás do outro. Nosso prefeito, vice e mais nove vereadores foram presos e afastados por três meses. Nosso juiz, Eduardo Arruda, assumiu e ficou apenas um mês no mandato. Assume a presidente da Câmara, Délia Razuk, que na verdade não era presidente, mas que foi eleita por vereadores hoje afastados e ninguém sabe, ainda, o que pode acontecer.

Anomia: Essa palavra estranha significa ausência de leis, de normas ou de regras de organização. Não é ainda o nosso caso, estamos “dando um jeitinho”, mesmo que aos trancos e barrancos. Só fico muito intrigado em ver que “o pau que bate em Chico não está batendo também em Francisco” 

Situação do Estado: Se Dourados está vivendo nessa penumbra de insegurança em relação ao desencadeamento da Uragano, o Estado de Mato Grosso do Sul está completamente nas trevas. Ora vejam, alguns políticos douradenses foram presos, enquanto nada mais se fala a respeito da situação do governador André Puccinelli, acusado de receber dois milhões mensais da Assembléia Legislativa.

Eduardo no Parque: Nós douradenses, que nos sentimos humilhados diante da Operação Uragano, deveríamos exigir a nomeação do juiz Eduardo Rocha, para exercer o governo no Estado no Parque dos Poderes enquanto o governador aguardaria julgamento. E nem precisaria estar preso. Bem, se o nosso juiz Eduardo não puder, então que se nomeie um lá de Campo Grande mesmo.

Afinal, só Dourados? Pergunto-me o porquê de apenas os políticos de Dourados serem presos, e ainda de alguns deles permanecerem tanto tempo na cadeia. Eles, segundo entendo, poderiam responder em liberdade, pois somente ficam presos aqueles que apresentam algum tipo de perigo à sociedade ou prejudicam diretamente nas investigações. Aliás, quem prejudica as investigações, caso não seja afastado imediatamente do cargo é o governador André Puccinelli. Não sou especialista, mas será que André, Rigo e demais comprometidos precisariam ser gravados pegando dinheiro vivo para serem presos ou afastados?

Perguntar não ofende: Ao menos foi o que sempre ouvi dizer, perguntar não ofende. Previno-me; estou apenas perguntando, não estou fazendo juízo de valor. Compete à Justiça a responsabilidade de apurar os fatos denunciados e julgar.

Para entender: O leitor que acompanha as minhas crônicas deve compreender agora ainda melhor porque sempre defendi que as campanhas eleitorais deveriam ter financiamento público. Ora, sem uma profunda reforma política para nos adequarmos aos novos tempos é isso o que acontece. Muitas coisas foram postas às nossas vistas, mas seria tudo?

O parto da montanha: Nossa montanha está em trabalho de parto. OAB, Imprensa, Associações, Entidades de Classe, Clubes de Serviços, Sindicatos, Escolas, Universidades, entes representativos de nosso povo, todos nos aproximamos da montanha para vermos o que acontecerá. Se ficarmos apenas observando, passados os meses, não poderemos reclamar se o ente parido for apenas um rato. Se nos sentirmos todos responsáveis por essa cidade e por esse estado, haveremos de nos manifestar para que desse parto doloroso nasça um vigoroso rebento de luz que nos traga melhores e mais felizes dias.

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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