A morte do mestre

Wilson Valentim Biasotto*

A morte do mestre

O que se poderia esperar de alguém cujo nome estivesse sendo cogitado para ser Secretário de Educação?

Que estivesse preparado ou que se preparasse, responderá o atento leitor.

É isso, pois não basta ter boa vontade. A formação, o preparo, a experiência e a capacidade de manter a mente aberta para a atualização continuada têm peso significativo para quem pretende atuar como administrador público.

Procurei atualizar-me, rever conceitos, estudar novas teorias, capacitar-me para o cargo que me fora oferecido logo após as eleições de outubro de 2004.. E nessa busca, com certeza muito construtiva, ao invés de encontrar o caminho para a Secretaria de Educação, encontrei a explicação, o motivo que fez com que uma das tendências do meu partido, o PT, não permitisse a minha nomeação.

Minha maior dificuldade estava relacionada à Educação Infantil, primeiro porque nunca foi o meu campo de atuação, depois porque essa modalidade está em fase de implantação no Brasil e, de modo particular, em Dourados. Para superar as minhas dificuldades li várias obras a respeito, inclusive “Brincar, conhecer, ensinar”, de Sanny S. da Rosa, publicada pela Editora Cortes, quando me deparei com o capítulo intitulado “A morte do mestre: ou sobre o fim da tarefa educativa”.

Nessa obra aprendi que Alcebíades, discípulo de Sócrates, em um discurso, confessou que o seu desejo era que ele [Sócrates] “desaparecesse de entre os vivos”. O sentido dessa frase é que somente com a morte do mestre ele poderia usa-lo. Trata-se, portanto, de um processo de destruição marcado por ataques e desafios à autoridade e ao saber do mestre.

O mestre deve “suportar” os ataques, não passivamente, mas impondo-lhes resistência. Suportar significa sobreviver e usar o mestre significa comunicar-se com ele sem que haja a relação mestre/discípulo, mas uma comunicação sem medo, de forma que o saber do mestre seja um “instrumento do processo de crescimento e diferenciação do educando”.

Heureca! É isso mesmo pensei com os meus botões. Eu tinha a necessidade de ser “morto”, pois o grupo que pretendia a Secretaria de Educação era encabeçado por ex-alunos meus. Bons alunos, como Alcebíades, têm necessidade de “matar” o mestre.

Interessante é que eu sabia, na prática, exatamente como se dá esse processo. Só que nunca tinha teorizado sobre ele, a leitura do livro “Brincar, aprender, ensinar” foi como um estalo, uma luz súbita que iluminou as muitas “mortes” pelas quais passei.

Vários alunos “mataram-me” ainda em plena sala de aula, outros “mataram-me” anos depois de formados. E as minhas “mortes” não aconteceram apenas em relação aos meus alunos de sala de aula, fui “morto” pelos meus sucessores no Sindicato dos Professores, fui “morto” como criador a idéia da Universidade Federal da Grande Dourados, e tantas vezes fui “morto” que nem sei contar.

 Com as minhas primeiras “mortes” eu não me conformava, achava ingratidão ver alunos de graduação contestando o que lhes ensinava; depois passei a admitir que o bom professor era justamente aquele cujos alunos o superavam, então passei a instigar os meus alunos a contestarem os meus ensinamentos. Hoje compreendo mais claramente essa situação: a morte do mestre é a vida do aluno, é o seu batismo, a passagem de discípulo para a condição de mestre. Por sua vez a resistência do mestre é a sua própria renovação, é a demonstração da sua capacidade de continuar aprendendo e superando-se.

A experiência tem me mostrado que quando esses “matadores” de mestres são também eles próprios mortos, há uma espécie de (re)conciliação ou de (re)conhecimento desse processo que acaba sendo muito rico para todos.

Portanto, a conclusão é de que quanto mais o mestre é morto mais obras ele criou. Por outro lado, há que se considerar a responsabilidade de quem “mata” o mestre: se o seu projeto resultar em benefício inferior ao oferecido pelo mestre “morto”, o “matador” não passará de charlatão oportunista.

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br