Para explicar o impeachment

 

Aprendi com Collingwood que a história é o estudo o passado para compreendermos melhor o presente e termos uma visão do futuro. Não obstante outras concepções Collingwood continua sendo boa referência.

Essa definição me ajuda a compreender o impedimento da presidente Dilma e também porque boa parte dos brasileiros aplaudiram o desfecho de 31 de agosto. Fatídico mês de agosto para a história brasileira: em agosto Getúlio suicidou-se; em agosto de 1961 Jânio renunciou estabelecendo uma crise que alimentou um golpe contra João Goulart e culminou com o golpe de 1964. Em agosto morreram Juscelino Kubitschek (trágico acidente automobilístico), Miguel Arraes, Eduardo Campos (acidente aéreo). Em 28 de agosto de 1992 iniciou-se o processo de impeachment de Collor; em 31 de agosto Costa e Silva faleceu e os militares formaram uma junta governativa para impedir a posse do legítimo vice-presidente, Pedro Aleixo. Não é de admirar, portanto, que a presidente Dilma tenha sido impedida de governar justamente em 31 de agosto.

Mas a história não é feita de fatalidades e coincidências ocorridas no mês consagrado a Cesar Augusto. A história é feita com as transformações que ocorrem na sociedade. Transformações às vezes de curta, às vezes de longa duração, ou mesmo rupturas abruptas que deixam os historiadores perplexos, mesmo tendo a suposta capacidade para compreender o presente graças ao estudo do passado.

O caso do impedimento da presidente Dilma pode ser explicado pela compreensão de um período de longa duração que se iniciou com a chegada dos portugueses e culminou com o avento do capitalismo, com a formação de uma plutocracia dominante que ignora o sentido de igualdade social.

A classe dominante pode ser representada ora pelos senhores de escravos, que mantiveram a mancha da escravidão em nosso país até 1888, ora pelos industriais que, por eles, manteriam até hoje jornadas de 18 horas semanais, ora por banqueiros.

Em resumo, com o advento do sistema capitalista, a sociedade organizou-se em duas classes, a dominante e a dos trabalhadores. Cada uma dessas classes está dividida em categorias. A dominante com banqueiros, industriais, grandes proprietários rurais, rentistas, enfim, há uma divisão formal por atividades, mas uma única mentalidade: a da exploração do homem pelo homem. Quanto a classe trabalhadora temos bancários, professores, empregados da construção civil, das indústrias, enfim, categorias que perderam os meios de produção e ficaram única e exclusivamente com a força de seu trabalho para a subsistência.

Em toda a história da humanidade a classe dominante sempre arrumou argumentos para justificar sua dominação. No estágio capitalista atual as coisas não se passam de forma diferente. Os dominadores, colocam a seu serviço os empresários midiáticos, mesmo porque eles também se constituem em uma categoria da classe dominante e conseguem disseminar entre os trabalhadores menos conscientes a ideia de que as coisas são como são porque assim deve ser.

A classe dominante, como nos ensinou Cornelius Castoriades, procura mistificar a classe dominada e tanto o faz, de geração em geração, que ela própria acaba mistificando-se, ou seja, acaba acreditando que as diferenças sociais são legítimas e que o poder, muito embora a Constituição reze que emana do povo e em seu nome é exercido, não admite o povo no poder. No Brasil, qualquer possibilidade de um governante pender a favor dos dominados transforma-se em golpe de estado. Assim foi com Getúlio, com Jango, com Lula. A classe dominante precisava tirar Dilma do poder e tirar também as chances de uma possível candidatura de Lula em 2018. Gente de esquerda representa uma ameaça constante ao status quo. Janainas, Moros, jornalistas subservientes e uma boa parte do que se costuma denominar “classe média”, não passam de seres mistificados pela classe dominante.

Bem, sobre previsões para o futuro, faltam luzes e sobram túneis, mas a classe dominante continuará, com certeza, encontrando meios para escamotear a realidade e sempre haverá uma maioria alienada para acreditar que um golpe jurídico-midiático e político é um impeachment legítimo. Melhor foi dito pelo senador Heráclito Fortes: “ se foi golpe, foi um golpe democrático”.

Explicado?

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