Marti: sem a luz do seu olhar

 

 

Era comum na época da ditadura militar que policiais, especialmente da Polícia Federal, mas também da Polícia Rodoviária e até delegados de polícia frequentassem cursos de Ciências Sociais ou Humanas, pois para eles eram nesses cursos que residiam alunos e professores contrários à ditadura. Tive vários, mas o inusitado foi quando recebi a visita de um delegado de polícia que deseja conhecer a minha biblioteca para ver se encontrava alguma obra que lhe servisse para redigir um trabalho.

A visita foi feita de surpresa e embora naquela semana eu tivesse comprado clandestinamente o livro de Paolo Nosela “Por que mataram Santo Dias”, e conseguido uma cópia em xerox da “Guerrilha do Araguaia”, não tive tempo de ocultá-las, aliás como não ocultei absolutamente nada, embora tivesse várias obras que poderiam levar o delegado a concluir o óbvio, que eu era contrário à ditadura.

Aquela visita era dúbia. Seria mesmo uma investigação? A biblioteca não era grande, ocupava, como ocupa até hoje, as pareces de um quarto de oito metros quadrados, mas eis que o delegado corre o olho em uma estante e, para minha surpresa, lá encontrou o livro de Plínio Correia de Oliveira: “Sou católico: posso ser contra a reforma agrária? ”. Nessa obra o autor defende que pode e deve ser contra a reforma agrária. Intimamente fiquei envergonhado de ter esse livro em minha biblioteca, afinal sempre defendi a reforma agrária, e só tempos depois descobri que ele me fora doado juntamente com outros livros de história por uma prima, mas esse livro pode ter sido a minha salvação, se é que o delegado queria conhecer-me pelas obras que eu possuía. Tristes tempos, quantos e quantos livros foram queimados, destruídos, antes que agentes da ditadura vasculhassem as bibliotecas de “suspeitos”.

Mas tudo passa. Atualmente podemos ler e guardar toda a obra que quisermos. Bem, nem todas, “Marti: sem a luz do teu olhar”, do consagrado escritor douradense, Brígido Ibanhes, membro da Academia Douradense de Letras” está sob censura.

Não consigo explicar o porquê, como explicar o inexplicável? Se foi determinado que esse livro fosse retirado das estantes das escolas é de se pensar que outros também o foram. O que leva uma administração municipal a tomar uma atitude dessa natureza?  “Marti”  foi escrito em 1977 e trata-se de um romance que retrata a vida de uma jovem maltratada sexualmente e fala também da bipolaridade, tendo como pano de cena Campo Grande e Dourados. Prefaciado pelo renomado professor douradense, Paulo Nolasco, jamais havia sofrido qualquer tipo de censura.

Agora, depois que se descobriu que esse e mais quatro livros (quais?) foram retirados das estantes das escolas municipais, leio as desculpas esfarrapadas de quem mandou fazer tal obra.  Diz a bibliotecária que assinou a ordem de retirada e que o fato se deu apenas para que uma comissão colocasse no livro o selo indicando qual a faixa etária à qual convinha esse tipo de leitura.

Claro que a providência do selo é certa. Para cada faixa etária um tipo de leitura. Leituras mal acompanhadas por pais e professores podem levar à perversão, ao contrário, com boa orientação forma-se o leitor cidadão, coisa que está ficando cada vez mais rara no Brasil e no Mundo. Mas, não precisaria haver a retirada senão de um único livro, feita a análise por uma comissão, sem que houvesse a necessidade da censura.

De qualquer forma a promessa é de que o livro volte para as estantes. Vamos esperar, a gente vive esperando. Lembram-se que esperamos o trem, esperamos alguém, e até mesmo esperamos a morte. Deus nos livre. Ou então podemos dizer que a espera é triste, mas eu espero cantando.

Os trabalhadores esperam o aumento salarial, que não vem. Professores de estados governados pelo PSDB estão praticamente todos em greve, Pará, São Paulo, Paraná, com o absurdo e covarde ato de terem sido espancados e, agora, dia 29 próximo começa a greve em Mato Grosso do Sul. E vamos esperando que o mês fique mais curto para que o salário não termine antes.

Mas, na verdade, o bom mesmo é esperar o bom, a festa, a alegria. Eu, com os meus familiares, estamos hoje esperando uma nova vida em nossa família, a vinda de nossa netinha, a Luiza. Que seja bem-vinda. Quando mesmo teremos mudança de lua?  

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

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2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

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MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

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Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

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Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

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[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

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[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

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[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

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