Os rolezinhos e as novas exigências dos jovens

Já foi o tempo em que passeios em locais públicos chamavam-se footing. Os moços parados e as moças dando voltas pela praça, surgindo as paqueras, os namoros, os casamentos. Vieram os rolezinhos que originariamente tinham mais ou menos as mesmas características que o footing, ou seja, um passeio que os jovens faziam para espairecer. Agora, com as possibilidades abertas pelas redes sociais, os rolezinhos envolvem multidões de jovens que marcam encontros e fazem as suas festas respirando ar condicionado.

Esses jovens, demonizados pelos proprietários ou lojistas de shoppings, precisam ser compreendidos, ao invés de espancados por uma polícia nem sempre bem preparada.

Para compreendê-los penso que devemos partir de três entendimentos: a) o que é um shopping senão a catedral do capitalismo, onde se encontram apenas os privilegiados por boas posses financeiras? b) o que é a periferia senão o logradouro dos excluídos, das pessoas ignoradas pela deusa fortuna? c) o que é o jovem senão alguém cheio de energia, de libido, de sonhos possíveis e impossíveis?

Suponho que esses jovens despossuídos num determinado momento disseram: também quero estar lá. Mas sabemos como são as coisas, sozinho, com tênis barato, fica difícil, bate a vergonha. Em grupo as coisas mudam, a coragem se alimenta da soma e eles se sentem fortes. Correm, brincam, abraçam-se, fazem a festa. Festa às vezes estragada pela transformação do grupo em horda, ou quando se imiscuem os black blocs.

Para entender esse processo, vamos por partes. Primeiro, sugerir que esses jovens façam o rolezinho em sambódromos ou praças e parques públicos é demonstrar total incompreensão do que está subjacente a esse novo movimento que ganha o Brasil. Trata-se da erupção massiva de algo que esteve represado ao longo de séculos. É a manifestação daquilo que chamamos atualmente de imaginário social (inconsciente coletivo). Ao escolherem os shoppings, os jovens querem dizer que também querem possuir, também desejam ar condicionado, tênis de marca, querem usufruir das benesses que o trabalho de seus pais produziram ao longo do tempo. E se não for uma manifestação desse inconsciente coletivo, então as coisas se complicam ainda mais para as autoridades constituídas, pois seria a tomada de consciência política de sua pobreza. Ser pobre é uma coisa, ter consciência política de sua pobreza é outra coisa, bem diferente, que gera reações contra o status quo.

Segundo: Claro que os proprietários de shoppings estão nervosos. Apelam para que a Justiça lhes conceda liminares proibindo os rolezinhos. É razoável que estejam preocupados, afinal, como disse acima, se os black blocs infiltrarem-se nesses grupos, então os rolezinhos se transformarão em quebra-quebras uma vez que os black são influenciados por uma forma de anarquismo em que quebrar faz parte do jogo e para eles isso é tão natural quanto é a corrupção no mundo capitalista.

Terceiro ponto. A polícia militar brasileira não tem uma conduta uniforme para esses tipos de manifestações. Em alguns lugares e em certas circunstâncias apenas acompanha atentamente o ato e somente atua em casos extremos. Em outros lugares, dependendo do governo do estado e do comandante da polícia, chega o porrete sem dó e nem piedade, mesmo que não tenha havido razões objetivas para tanto.

Tudo isso em ano de eleições quase que gerais e em ano de Copa do Mundo em nosso país. Mas não creio que os rolezinhos, e mesmo outras manifestações que deverão vir por aí sejam direcionadas a prejudicar esse ou aquele candidato em particular e nem para obscurecer o brilho da Copa. Os políticos são uma necessidade e a Copa em si é uma grande festa. Ocorre que os políticos estão sendo vistos como uma casta, com privilégios inconcebíveis e a Copa, que deveria ser a grande festa do povo, assim como o carnaval, se transformou em espetáculo para uma elite endinheirada. O povo, que é bom, vai assistir aos jogos amontoados em praças públicas, ou quando muito em suas próprias casas, pela televisão sujeita a sair do ar, graças às deficiências que já são sentidas, principalmente pela privatização do setor energético.

A verdade incontestável é que nunca a humanidade desfrutou de tantos bens, mas não soube ou não quis socializar esses bens. 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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