Esfaqueada, a presidente sangra

 

Recentemente assistimos a dezenas de manifestações populares nos Estados Unidos (Occupy Wall Street), a Primavera Árabe, com movimentos em Teerã, Madrid, Istambul; os protestos por questões urbanas na Turquia; contra o autoritarismo egípcio; movimentos por melhores condições de cidadania no Chile, no Uruguai, no Paraguai e de modo muito especial no Brasil. Já não há dúvidas de que as redes sociais da Internet têm ajudado de forma decisiva nesses movimentos, inclusive recentemente na China, em Guangzhou pela liberdade de imprensa. 

Está assente que as manifestações no Brasil ultrapassam o reajuste dos ônibus, houve uma espécie de libertação do inconsciente coletivo da população que passou a cobrar dívidas passadas e presentes das instituições que governam o país. Em resumo começou a cobrar cidadania.

Aqui, ao contrário de outras manifestações que se esvaziaram pela chegada do inverno, pelo desgaste dos manifestantes ou pela repressão policial violenta, a presidente Dilma foi rápida em ouvir o clamor do povo. Mas a sua reação bem intencionada pareceu-me um tiro pela culatra e ela começou a receber punhaladas oriundas de vários setores.

A primeira punhalada foi desferida pela própria presidente Dilma, justamente por chamar para si a responsabilidade de responder ao clamor do povo brasileiro. Nunca um presidente assumiu com tanta coragem e responsabilidade os problemas levantados pelo seu povo. Um dos maiores entendidos em movimentos populares, o sociólogo espanhol Manuel Castells, afirma que a presidente Dilma “é a primeira líder mundial que presta atenção, que ouve as demandas de pessoas nas ruas. Ela mostrou que é uma verdadeira democrata”.

Não obstante tomar posição, chamar para si a responsabilidade de encaminhar soluções, transpareceu ao povo que ela era culpada por tudo e a isso se deve em grande parte a sua queda de popularidade. Parece que a atitude da presidente tenha sido um tiro no próprio pé, mas acredito que ela agiu corretamente e que o tempo “senhor da razão”, como diziam os latinos, haverá de esclarecer quem é mais e quem é menos responsável pela situação que atravessamos.

Outras punhaladas vieram pelas costas, as primeiras partiram dos tucanos para tirar proveito político da situação, e a fila foi engrossando, inclusive com ministros do Supremo questionando a constitucionalidade das reformas, depois políticos de todos os matizes, preocupados em perder privilégios e, também, entidades de classe e categorias de trabalhadores mais bem organizadas protestando em relação a questões pontuais, como a vinda de médicos estrangeiros, a PEC 37, o valor do frete, a carga tributária. Enfim, os ataques à presidente foram aumentando, mas principalmente em relação à proposta de um plebiscito para fazer a reforma política. Com todas essas punhaladas a presidente sangra, principalmente porque o povo não percebeu que ela quis atender ao próprio clamor popular.

Na verdade Dilma acertou o alvo em cheio: o nosso remédio de impacto está em uma ampla reforma política. O aumento de vinte centavos nas tarifas foi apenas o estopim, na verdade o descontentamento é viver em cidades onde se passa boa parte da vida dentro de meios de transporte precários, enquanto aviões da FAB são requisitados por políticos para suas lambanças, enquanto a justiça demora a ser feita, enquanto a corrupção corre solta.

Para reformular a mobilidade urbana, para combater a corrupção, para melhorar a saúde e a educação, enfim para cuidar dos problemas do país só há uma solução: atacar a sua causa, ou seja, fazer com que as entidades se reconciliem com o povo. E isso só será possível se reformularmos as instituições, não com esses atuais representantes que teriam que cortar a própria carne. Então, vindo o plebiscito, não poderá faltar uma questão: o povo brasileiro deseja uma Constituinte específica para a profunda reforma política que necessitamos?

Com a reforma política as demais demandas aconteceriam quase que naturalmente: reforma tributária, do judiciário, dos tribunais de contas e, gradativamente, mas com a urgência requerida. É isso que o povo quer e merece, mas ao terminar essa crônica já constatei que os lobos devoraram a ovelha, o governo recuou. Vamos aguardar a reação popular. 

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

Voltar

Livros

As Fabulosas Histórias de Bepi Bipolar

Ser convidada para escrever o prefácio deste livro de literatura
foi realmente muito gratificante e a deferência a mim concedida
pelo amigo, historiador e escritor Wilson Valentin Biasotto foi
recebida com surpresa e alegria

Abrir arquivo

2010: O ANO QUE NÃO ACABOU PARA DOURADOS

A obra ora apresentada é uma coletânea de crônicas publicadas em diversos meios de comunicação no ano de 2010. Falam, sempre com elegância e fluidez, de nossas vidas, de acontecimentos e de possíveis eventos em nosso país, especialmente em nosso município.

Abrir arquivo

MEDIEVO PORTUGUES: O REI COMO FONTE DE JUSTIÇA NAS CRÔNICAS DE FERNÃO LOPES

Nossa preocupação, nesse trabalho, foi a de estudar o comportamento dos reis, no que concerne à aplicação da Justiça, baseados nas crônicas de Fernão Lopes.

Abrir arquivo

Crônicas: Educação, Cultura e Sociedade

O livro ora apresentado é um apanhado de 104 crônicas, algumas de 1978 e a maioria escrita a partir de 1995 até a presente data. O tema Educação compõe-se de 56 crônicas, outras 16 são relatos descrevendo fábulas ou estórias oriundas da cultura italiana, e os emas Cultura e Sociedade compreendem, cada um, 16 crônicas.

Abrir arquivo

Crônicas: globalização, neoliberalismo e política

Esta obra foi editada em 2011 pela Editora da UFGD e reune 99 crônicas escritas principalmente nos últimos quinze anos, versando sobre a globalização, o neoliberalismo e política

Abrir arquivo

[2009] EDIFICANDO A NOSSA CIDADE EDUCADORA

Esse trabalho tem três objetivos principais, cada qual contemplado em uma das três partes do livro, como se verá adiante. O primeiro é oferecer ao leitor algumas reflexões sobre temas que ocupam o nosso dia-a-dia; o segundo é divulgar os vinte princípios das Cidades Educadoras e, finalmente o terceiro, é tornar público o projeto que nos orienta na transformação de Dourados em uma Cidade Educadora e mostrar os primeiros passos para a operacionalização desse projeto.

Abrir arquivo

[1998] Até aqui o Laquicho vai bem: os causos de Liberato Leite de Farias

Ao refletir sobre a importância do contador de causos/narrador para a preservação da cultura, percebe-se que cada vez menos pessoas sabem como contar/narrar, com a devida competência, as experiências do cotidiano. Por quê? Para Walter Benjamin, as ações motivadoras das experiências humanas são as mais baixas e aterradoras possíveis em tempos de barbárie; as nossas experiências acabam parecendo pequenas ou insignificantes diante da miséria e da fragmentação humana, numa constatação que extrapola os espaços nacionais.

Abrir arquivo

[1991] O MOVIMENTO REIVINDICATÓRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: 1978 - 1988

Momentos de grandes mobilizações têm teito do professorado de Mato do Sul a vanguarda do movimento sindicalista deste Estado. Este fato motivou a realização deste trabalho, que teve como proposta inicial analisar criticamente o movimento reivindicatóno do magistério de Mato Grosso do Sul, na perspectiva de revelar-lhe, tanto quanto possível, o perlil de luta, ao longo de sua palpitante trajetória em busca de melhorias salariais, estabilidade empregatícia e melhoria da qualidade do ensino.

Abrir arquivo

Contato

Informações de Contato

biasotto@biasotto.com.br