Biasotto profere palestra em Nova Andradina

 

04/10/04 – Palestra “Cidades Educadoras”

 

            O conceito de Cidade Educadora surgiu em Barcelona, Espanha, em 1990. Quatro anos depois, foi aprovada a Carta de Princípios das Cidades Educadoras. Hoje, cerca de 280 cidades em todo o mundo estão afiliadas à Associação Internacional das Cidades Educadoras (AICE), dentre  as quais, 9 são brasileiras. Os experimentos mais bem sucedidos são apresentados anualmente no Congresso Internacional das Cidades Educadoras, que neste ano acontecerá no mês de novembro, em Gênova, Itália.

Não é curto nem sem obstáculos o caminho que se tem que percorrer para que uma cidade seja aceita na Associação das Cidades Educadoras. No entanto, o mais gratificante é que esse percurso preparatório, por si, resulta em grandes avanços em termos sócio-culturais e educacionais. Há necessidade que as cidades se preparem, não somente oferecendo um ensino formal de qualidade como também oferecendo projetos inovadores no campo social, educacional e cultural.

            Tendo um governo eleito democraticamente e o compromisso do prefeito e da Câmara Municipal em incentivar novos projetos voltados à educação a cidade pode avançar em projetos educacionais, sociais, culturais, de modo a credenciar-se para tornar-se uma cidade educadora.

 Mas, não falemos em dificuldades e avancemos no conceito de cidade educadora:

 Durante o Sexto Congresso das Cidades Educadoras, que aconteceu em novembro de 2000, em Lisboa, José Saramago colocou a seguinte questão: “Quem é que educa a cidade?”. As respostas foram múltiplas.

            “A cidade educa para a cidadania, é um instrumento de cidadania”, afirmou Raul Pont, prefeito de Porto Alegre, que realçou a possibilidade de, nesta dinâmica, “sermos ao mesmo tempo produto e produtores [da educação]”.

            O professor português Adalberto Dias Carvalho, da Universidade do Porto, escreveu: “A idéia de cidade educadora implanta-se com a tomada de consciência social de que educar, uma tarefa específica da escola e da família, é, antes de mais, uma responsabilidade da sociedade no seu todo. As cidades não têm que redundar necessariamente em espaços de violência e exclusão, conforme tendem a ser estigmatizadas   pelas próprias realidades sociais em que freqüentemente mergulham. As cidades são também e sobretudo centros privilegiados de oportunidades”.

Em resumo, a educação não deve ser exclusividade de instituições como a escola e a família; ela também deve ser competêwncia da cidade que precisa se tornar efetivamente um espaço educacional.

Em outras palavras é o que disse em São Paulo, o professor Moacir Gaddotti, diretor geral do Instituto Paulo freire, em relação às cidades educadoras, quando explicou que: “Todos os espaços da cidade devem se transformar intencionalmente em espaços educativos. Queremos que o cidadão não seja apenas um consumidor, mas, sim, um sujeito ativo, que influencie seu próprio ambiente”

            A argentina Alicia Cabezudo, diretora da Rede Latino Americana de Cidades Educadoras, explicou, em entrevista à Folha de São Paulo, sua idéia de cidade educadora: “É aquela que converte o seu espaço urbano em uma escola. Imagine uma escola sem paredes e sem teto. Nesse espaço, todos os lugares são salas de aula: rua, parque, praça, praia, rio, favela, shopping e também as escolas e as universidades. Há espaços para a educação formal, em que se aplicam conhecimentos sistematizados, e a informal, em que cabe todo tipo de conhecimento. Ela integra esses tipos de educação, ensinando todos os cidadãos, do bebê ao avô, por toda a vida”.

           

            A Carta de Princípios da Cidade Educadora é composta por 20 itens que sintetizaremos agora:

  1. Todo cidadão terá o direito de usufruir dos meios e oportunidades de formação, desenvolvimento pessoal e entretenimento que a cidade oferece. A educação deverá ser promovida de modo que se evite a exclusão motivada pela raça, sexo, cultura, idade, deficiência, condição econômica ou outros tipos de discriminação.
  2. Os municípios exercerão com eficácia as competências que lhes são atribuídas em matéria de educação. Eles deverão desenvolver uma política educativa com o fim de incluir todas as modalidades de educação formal e não formal, as diversas manifestações culturais, as fontes de informação e os meios de descoberta da realidade que existam na cidade.
  3. As competências em matéria educativa deverão ser postas em um contexto mais amplo de qualidade de vida, de justiça social e de promoção dos habitantes.
  4. Os responsáveis pela política municipal devem ter conhecimento da situação e das necessidades de seus habitantes, para que, em virtude disso, possam realizar estudos, e por meio deles, elaborar propostas concretas.
  5. O município deve conhecer  o desenvolvimento da ação formativa realizada em seus centros de ensino estruturado. Além disso, deve conhecer e promover iniciativas de educação não formal, voltadas ao conhecimento real da cidade e à formação e  informação dos habitantes, visando uma cidadania responsável.
  6. O município procurará estabelecer um equilíbrio entre a necessidade de proteção e a autonomia necessária para a descoberta. Proporcionará fóruns de debate, com o intercâmbio entre as cidades, para que os habitantes possam utilizar plenamente as mudanças geradas pelo mundo urbano.
  7. A satisfação das necessidades das crianças e dos jovens pressupõe uma oferta de espaços, equipamentos e serviços adequados ao desenvolvimento social, moral e cultural. O município deverá levar em conta o impacto de suas decisões.    
  8. A cidade oferecerá aos pais uma formação que lhes permita ajudar seus filhos a crescer e utilizar a cidade num espírito mútuo. Para isso, deverá promover projetos destinados aos educadores em geral  e divulgar instruções a todas as pessoas que tenham contato com  as crianças.
  9. A cidade deverá oferecer aos seus habitantes a possibilidade de ocupar um lugar na sociedade; aconselhá-los sobre a sua orientação pessoal e profissional e facultar a sua participação numa ampla gama de atividades sociais. No âmbito específico da relação educação/trabalho é importante assinalar a estreita relação que deverá existir entre a planificação educativa e as necessidades do mercado de trabalho. As cidades definirão estratégias de formação que tenham em conta a procura social e colaborarão com as organizações de trabalhadores e empresários na criação de postos de trabalho.
  10. A cidade deverá conhecer os mecanismos de exclusão e de marginalização que a afetam, assim como desenvolver as intervenções compensatórias adequadas. Deverá  prestar atenção especial aos indivíduos recém chegados, emigrados ou refugiados, para que estes sintam que esta cidade é a sua.
  11. As intervenções que se destinem a corrigir desigualdades devem partir de uma concepção global do indivíduo, que satisfaça seus interesses, mas também os direitos comuns a todos.
  12. A cidade incentivará o Associativismo com o fim de formar os jovens para a tomada de decisões, canalizar atuações ao serviço da sua comunidade e obter e difundir informação.
  13. A cidade educadora deverá ensinar os seus habitantes a informar-se, formar na informação. Estabelecerá instrumentos úteis e linguagens adequadas para que os seus recursos estejam ao alcance de todos em um plano de igualdade. Deverá certificar-se de que a informação abranja todos os níveis e idades.
  14. Se necessário, as crianças disporão de locais de informação e de auxílio especializado, e, em certos casos, de um conselheiro.
  15. Uma cidade educadora deverá saber encontrar, preservar e divulgar a sua própria identidade.  A valorização dos seus costumes e das suas origens deve ser compatível com os modos de vida internacionais. Poderá, assim, oferecer uma imagem atrativa sem desvirtuar o seu ambiente natural e social.
  16. A transformação e o crescimento de uma cidade deverão ser regidos pela harmonia entre as novas necessidades e a perpetuação de construções e símbolos que constituam claras referências do seu passado e da sua existência. O planejamento urbano deverá levar em conta o seu impacto no desenvolvimento de todos os indivíduos, na integração das suas aspirações pessoais e sociais e deverá agir contra a segregação de gerações, as quais têm muito a aprender mutuamente.
  17. A cidade deverá garantir a qualidade de vida a partir de um meio ambiente saudável e de uma paisagem urbana em equilíbrio com o seu meio natural.
  18. A cidade favorecerá a liberdade e a diversidade cultural. Acolherá tanto as iniciativas de vanguarda como a cultura popular. Contribuirá para corrigir as desigualdades que surgem na promoção cultural, resultantes de critérios exclusivamente comerciais.
  19. Todos os habitantes têm o direito de refletir e participar na criação de programas educativos, dispondo de todos os instrumentos que lhes forem necessários.
  20. Uma cidade educadora não segregará gerações. Os princípios enunciados nesta carta são o ponto de partida para o desenvolvimento do potencial educativo da cidade, podendo esta ser completada em aspectos que não foram abordados.

 

O movimento das “Cidades Educadoras” procura responder de maneira mais ampla e co-participativa ao desafio da educação neste início do século XXI. O projeto propõe uma nova auto-compreensão da instituição escola, mas também amplia as responsabilidades pela educação, que ultrapassam os tradicionais agentes, escola e família, para agregar o conjunto das instituições públicas e privadas que agem sobre a cidade em um esforço comum para a tarefa da educação, que deve ser agora compreendida integral e permanentemente.

Tal projeto propõe, então, responder à crise da escola formal, bem como à crise do espaço urbano que perdeu sua condição libertária do início da modernidade. A cidade que hoje é um lócus de cotidiano treinamento e informação voltada para a valorização capitalista, pode ser transformada em espaço de educação e comunicação voltada para a cidadania e para o respeito ao indivíduo e ao gênero humano.

Uma Cidade Educadora deve ser, portanto, um sistema em constante evolução, que prioriza o investimento cultural e a formação permanente de sua população. Deve reconhecer, exercer e desenvolver não só suas funções tradicionais, mas também assumir uma postura de responsabilidade em relação à formação, à promoção e ao desenvolvimento de todos os seus cidadãos. Em síntese, é aquela que, além de cuidar com atenção da educação formal, transforma todos os locais públicos em espaços educativos. Significa dizer que em uma Cidade Educadora exercita-se a educação continuada que atinge desde o recém-nascido até o mais idoso de seus cidadãos.

 Por fim, uma cidade será educadora se oferecer todo o seu potencial de forma generosa, deixando-se envolver por todos os seus habitantes, e ensinando-os a envolverem-se nela.

 

Para finalizar, alguns exemplos práticos:

 

1.               Uma escola articulada com associações de bairros, conselhos gestores e empresas, entre outras instituições, pode obter ganhos diversos. Entre eles, melhor compreensão da comunidade acerca do papel da escola, geração de recursos e participação voluntária da população para a sua melhoria.

2.               Erradicação do analfabetismo;

3.               Educação ambiental;

4.               Orçamento participativo;

5.               Teatro, música, dança

6.               Na favela, solidariedade e amizade

7.               Parar na faixa

A diferença entre uma cidade que investe em Educação e uma cidade educadora é que a Cidade Educadora, participando da Associação pode partilhar projetos comuns: um deles, por exemplo, é o “minha cidade e o mundo”, um programa em que crianças e professores de diferentes partes do mundo trocam experiências entre si por correspondência. Por que não fazer o mesmo na região ou no estado, para começar.

www.edicities.bcn.es  www.educarede.org.br    www.portoalegre.rs.gov.br/fme/         www.camaracba.mt.gov.br  

      www.caxias.rs.gov.br    www.cm-feira.pt/site   www.aice2004.comune.genova.it. 

       www.espigueiro.pt/reportagem   www.amapa.gov.br    www.bcn. Es/edicities/aice/

       www.goiania.go.gov.br        www.apraco.com.br

A reprodução do texto é permitida desde que citada a fonte.

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